Déficit primário estimado para 2023 atinge R$ 203,4 bilhões
A expectativa de encerrar o ano com um déficit primário em torno de 1% do Produto Interno Bruto (PIB) não se concretizará, revela o mais recente Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas. O documento, que periodicamente orienta a execução do Orçamento, elevou para R$ 203,4 bilhões a estimativa do déficit primário deste ano, representando 1,9% do PIB. Os desafios fiscais do governo, pressionados pela compensação a estados e pela recomposição do piso da saúde, impulsionaram esse cenário.
Comparado ao relatório anterior, divulgado em setembro pelos Ministérios da Fazenda e do Planejamento, a previsão de déficit primário aumentou consideravelmente, saindo de R$ 141,4 bilhões. Esse cálculo segue o critério “abaixo da linha”, utilizado pelo Banco Central, essencial para o cumprimento das metas fiscais delineadas na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
Para 2023, a LDO estabelece uma meta de déficit primário de R$ 231,5 bilhões, mas o valor efetivo diminui para R$ 213,6 bilhões, após algumas compensações da União, fruto de um acordo com o Supremo Tribunal Federal (STF).
Razões do Aumento Três principais fatores justificam o aumento na previsão do déficit primário. Primeiramente, a Lei Complementar 201/2023 antecipou a compensação de R$ 16,3 bilhões para estados e municípios para reembolsar perdas devido à redução do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre combustíveis e a queda nos repasses do Fundo de Participação dos Estados e Municípios.
O segundo fator foi o dispêndio de R$ 4,3 bilhões para restaurar o piso da saúde. A sanção do novo arcabouço fiscal revitalizou a fórmula de cálculo, equivalente a 15% da receita corrente líquida, que estava em vigor antes do teto de gastos.
Inicialmente, o déficit poderia atingir R$ 21 bilhões, mas uma emenda na Lei Complementar 201/2023, introduzida pelo líder do PT na Câmara, Zeca Dirceu (PT-PR), reduziu essa diferença para R$ 4,3 bilhões. Segundo a emenda, o cálculo dos 15% da Receita Corrente Líquida incide sobre as receitas aprovadas no Orçamento de 2023, e não sobre as estimativas atualizadas a cada dois meses pelo Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas, o que resultaria em cerca de R$ 172 bilhões, ao invés de R$ 189 bilhões.
Ademais, o governo aguarda o veredito do Tribunal de Contas da União (TCU) para adiar a implementação do novo cálculo para 2024.
Impacto do Fundo do PIS/Pasep Os dois primeiros fatores elevariam a estimativa de déficit primário para R$ 177,4 bilhões (1,7% do PIB). O terceiro elemento que impulsionou a previsão além dos R$ 200 bilhões foi a exclusão de R$ 26 bilhões de recursos parados no antigo Fundo PIS/Pasep do cálculo das receitas. Embora a Emenda Constitucional da Transição tenha possibilitado ao governo apropriar-se dessas receitas, o Banco Central as classifica como receita financeira, não primária.
Considerando o critério do Banco Central para avaliar o cumprimento da meta de resultado primário, “abaixo da linha”, os Ministérios da Fazenda e do Planejamento optaram por remover esses R$ 26 bilhões do relatório.
Outros Fatores e Compensações No início do ano, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, havia estimado um déficit em torno de R$ 100 bilhões para 2023. De acordo com o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, além do piso da saúde e das compensações aos estados e municípios, quatro fatores impactaram as estimativas de déficit primário.
O primeiro foi a queda de R$ 9 bilhões na arrecadação federal devido à desvalorização do dólar e à redução da inflação. Os preços mais baixos das mercadorias impactam diretamente a arrecadação dos tributos ligados ao consumo. Ceron enfatiza que os R$ 9 bilhões referem-se apenas à queda estimada para os dois últimos meses do ano, totalizando um impacto de R$ 25,6 bilhões ao longo de 2023.
O segundo fator foi a redução da expectativa de depósitos judiciais da Caixa Econômica para o Tesouro Nacional. O atraso na transferência desses recursos resultará em uma queda de R$ 12,6 bilhões para R$ 5 bilhões neste ano, com o restante previsto para 2024.
Adicionalmente, o governo enfrentará perdas de quase R$ 130 bilhões devido a compensações tributárias, como os R$ 80 bilhões referentes a uma decisão do STF que retirou o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. A segunda compensação tributária diz respeito a R$ 46 bilhões de subvenções do ICMS, impactando o Imposto de Renda Pessoa Jurídica e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) de 2017.
Receitas e Despesas Todos esses fatores resultaram em uma redução de R$ 22,2 bilhões na previsão total de receitas primárias da União. Entretanto, a estimativa de receita primária foi elevada em R$ 21,9 bilhões, impulsionada principalmente pela assistência a estados e municípios e pela recomposição do piso da saúde.