Especial com Alcivando Lima – MORADIA NO CÉU
“Um político divide os seres humanos em duas classes: instrumentos e inimigos”. Friedrich Nietzsche
O efeito soporativo de ver TV às vezes retarda e, enfarado, posso ver e ouvir o que dizem os candidatos a prefeito e vereadores. Jorra-se desvelo e carinho de uns e cobras e lagartos de outros. Expressam-se com tanta veemência que se tem a impressão que estão lançando boia salva vidas para os ouvintes e que todos os que governaram e legislaram eram e continuam sendo uns tapados, que não conseguem fazer o óbvio. Num passe de mágica, solucionarão tudo. Poucos se dão conta de que está escrito na sua testa: Sou do time dos que se locupletam facinho, facinho.
Cem por cento prometem saúde, segurança, transporte, educação e, de resto, aos habitantes (atuais e pósteros), um paraíso carregadinho de anjinhos saltitando placidamente com suas liras por entre vales com suas garças, corças e gazelas apascentando sem se preocuparem se serão comidas agora ou amanhã por tigres, leões, onças, ursos ou cachorros vira-latas.
Convivo por dezenas de primaveras por estas paragens e, portanto, sei quem são. Uma grande parte foi e é comensal palaciano, macaco velho que não mete a mão na cumbuca. Os tenebrosos mares revoltos da realidade ficam em Marte ou na Cochinchina, não aqui.
Ouvi-los e vê-los se metamorfoseando dá uma comichão desgraçada de jogar-lhes na cara a incompetência de cada qual que promete solucionar, dentre outros, o transporte coletivo, baixando o preço ou não deixando aumentá-lo e depois o porrete desce na cacunda do bestão que chegou a brigar nos tapas e apanhou feito cachorro sem dono por esse ou aquele candidato.
Alguns desavisados de voz agudamente triste têm um desconhecimento bestial do assunto e para estes tudo é translúcido. Outros, sem relutância, batem no peito e tomam pra si o ônus de reger a orquestra sem sequer saber onde fica o púlpito do maestro. Estou a repetir o que disse o professor e jornalista Eugênio Bucci: “Um país se desfaz com machões e armas”.
Contudo, alguns são almas benignas. Para estes, transcrevo um trecho do romance Quincas Borba, do sempiterno Machado de Assis: “[…] Ah! Meu caro Rubião, isto de política pode ser comparado à paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo; não falta nada, nem discípulo que nega, nem discípulo que vende. Coroa de espinhos, bofetadas, madeiro, e afinal morre-se na cruz das ideias, pregado pelos cravos da inveja, da calúnia e da ingratidão”.