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Especial com Alcivando Lima – LIXO QUE NINGUÉM RECOLHE

“A punição que os bons sofrem, quando se recusam a agir, é viver sob o governo dos maus.” Platão – 428/348 a.C – (filósofo e matemático da Grécia antiga).

A humanidade convive, desafortunadamente, com dizimadoras pestes desde priscas eras. Inicio esta crônica citando a peste negra no remoto século XIV com demais registros de outras desbaratando seres humanos, afora aquelas que, subitamente dissipa um mundaréu de animais (galinhas, porcos, cavalos, vacas, etc.).

Lendo ou ouvindo relatos dessas calamidades, — a gripe espanhola (1918/19) ceifou cinqüenta milhões de vidas em todos os continentes sucumbindo aí o presidente Rodrigues Alves e contaminou um quarto da população mundial da época — nos enternecemos com as ações dos cientistas (Carlos Chagas foi um deles) com precaríssimos meios (hospitais sem equipamentos e escassez de leitos) com mortos amontoados nas calçadas esperando o recolhimento das suas esquálidas carcaças, cujo acolho vinha numa carroça puxada por um amundiçado pangaré arrodeado de pejadas moscas e muitas vezes se deparava com o gemido rouco, um aiaiai lamentoso prontamente socorrido com olhares compungidos, e mais um, mais outro e mais outro, dezenas, centenas numa rosca sem fim que predispôs uma solução clara, coerente, descomplicada e rápida: — crás — um baque seco duma pazada rachando o osso da testa, como se alguém tivesse enfiado o pé numa jaca mole. Pronto, fim da agonia.

A sublime natureza humilde do tatu peba foi duramente abjurada por ser flagrado fuçando as covas dos desinfelizes recém enterrados. Cessou-se o canto dum galo madrugador, raramente se via um cuitelinho encantando as crianças do mundo com seu ziguezagueante vôo e nunca que ninguém falou na harmonia, na modulação, no garganteio inconfundível do Uirapuru. Entretanto, continuava-se a engaiolar e furar os zóios do Assum Preto, aliando sua triste melodia ao pranto de quem perdeu seu ente querido e as aves necrófagas crocitavam e reencetavam seus vôos soturnos, pairando lugubremente sobre as vidas cerceadas pela peste.

Pouco mais de cem anos depois, a peste, renitente, volta para atormentar a humanidade, porém, mulheres e homens da ciência armaram-se com vacinas e equipamentos hospitalares foram instalados para ninguém mais ser alvo dos carniceiros e um corpo poder decompor-se, virar pó em certa paz.

Pandemia significa oportunidade de astronômicos lucros aos maus industriais, maus comerciantes e aos proxenetas desqualificados. A frase que o filósofo Raimundo Teixeira Mendes idealizou em 1889 para a nossa bandeira brasileira (Ordem e Progresso) é o mote do qual os pachorrentos se utilizam para alimentar a avidez, o egoísmo e a ganância daqueles que detém o direito de explorar um bem do qual a humanidade se serve (combustível fóssil e energia hidrelétrica, por exemplo) massacra o mundo com taxa de câmbio e impostos sem o menor prurido para manter a economia com o fiel da balança pendendo para o rico ficar mais rico e o pobre roer osso sem carne.

Na lápide destes e abaixo das frases alusivas às dores da família, devia ser permitido justapor o seguinte epitáfio: Aqui jaz um insidioso e seboso empresário e político mau caráter onde a perversidade fez morada durante toda a vida e foi um saprófago pantagruélico que viveu do sangue e da carne do povo, blasfemou e esparramou seu lixo fétido que ninguém recolhe.

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Alcivando Lima - Opinião Leitor

Alcivando Lima é escritor. Os artigos são de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do veículo.

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